Quando Angela tinha apenas dois ou três anos, seus
pais a ensinaram a nunca dizer NÃO. Ela devia concordar com tudo o que
eles falassem, pois, do contrário, era uma palmada e cama. Assim, Angela tornou-se uma criança dócil, obediente,
que nunca se zangava. Repartia suas coisas com os outros, era
responsável, não brigava, obedecia a todas as regras, e para ela os pais
estavam sempre certos.
A maioria dos professores valorizava muito essas
qualidades, porém os mais sensíveis se perguntavam como Angela se sentia
por dentro. Ângela cresceu cercada de amigos que gostavam dela
por causa de sua meiguice e de sua extrema prestatividade: mesmo que
tivesse algum problema, ela nunca se recusava a ajudar os outros. Aos trinta e três anos, Angela estava casada com um
advogado e vivia com sua família numa casa confortável. Tinha dois
lindos filhos e, quando alguém lhe perguntava como se sentia, ela sempre
respondia: "Está tudo bem." Mas, numa noite de inverno, perto do Natal, Angela
não conseguiu pegar no sono, a cabeça tomada por terríveis pensamentos.
De repente, sem saber o motivo, ela se surpreendeu desejando com tal
intensidade que sua vida acabasse, que chegou a pedir a Deus que a
levasse. Então ela ouviu, vinda do fundo do seu coração, uma voz serena que, baixinho, disse apenas uma palavra: NÃO. Naquele momento, Angela soube exatamente o que devia fazer. E eis o que ela passou a dizer àqueles a quem mais amava:
Não, não quero.
Não, não concordo.
Não, faça você.
Não, isso não serve pra mim.
Não, eu quero outra coisa.
Não, isso doeu muito.
Não, estou cansada.
Não, estou ocupada.
Não, prefiro outra coisa.
Sua família sofreu um impacto, seus amigos reagiram
com surpresa. Ângela era outra pessoa, notava-se isso nos seus olhos, na
sua postura, na forma serena mas afirmativa com que passou a expressar o
seu desejo. Levou tempo para que Angela incorporasse o direito de
dizer NÃO à sua vida. Mas a mudança que se operou nela contagiou sua
família e seus amigos. O marido, a princípio chocado, foi descobrindo na
sua mulher uma pessoa interessante, original, e não uma mera extensão
dele mesmo. Os filhos passaram a aprender com a mãe o direito do próprio
desejo. E os amigos que de fato amavam Angela, embora muitas vezes
desconcertados, se alegraram com a transformação. À medida que Angela foi se tornando mais capaz de
dizer NÃO, as mudanças se ampliaram. Agora ela tem muito mais
consciência de si mesma, dos seus sentimentos, talentos, necessidades e
objetivos. Trabalha, administra seu próprio dinheiro, e nas eleições
escolhe seus candidatos. Muitas vezes ela fala com seus filhos: "Cada pessoa é
diferente das outras e é bom a gente descobrir como cada um é. O
importante é dizer o que você quer e ouvir o desejo do outro, dizer a
sua opinião e ouvir o que o outro acha. Só assim podemos aprender e
crescer. Só assim podemos ser felizes."